Texto de Escola

"Tudo começara com a licença médica. Não que ele ignorasse por completo o objeto tão presente pelas salas de estar de sua vida. Acontece que com tamanha correria cotidiana e chegando tão tarde em casa, a perspectiva de se jogar na cama era muito mais aconchegante que uma tela de TV.

A médica recomendara repouso total, nada de grandes esforços e receitara centenas de remédios. Para tanto, nada mais propício que o sofá e, mais propício ainda, que este esteja em frente à uma televisão.

No começo era quase como uma descoberta: uma série, um desenho animado, aquela novela sobre a qual dona Ivone tanto falava, tudo ali tão perto e ele nem desconfiava. No começo, ele logo dormia, anestesiado, meio torto, no sofá. Foi depois de tantas reclamações sobre costas que doiam, que ele resolvera levar o eletrodoméstico para o quarto.

Foi neste momento que a coisa desandou.

Antes ele se perdia por entre os canais, confundia programações, perdia sempre os começos, um horror. A partir dali, possuia todos na mente e entre um 'pli, plim' e outro, escorregava entre as emissoras — uma levava a outra e ele não podia mais evitar. Do programa de culinária, ia para os desenhos e de lá para o jornal e daí vinha mais algumas distrações: uma reprise, um filme bobo, a novela de crianças, antiga, a engraçada, o jornal, um outro drama. Já havia terminado o dia, o sol já se escondera, mas ali estava ele, fiel àquela luz televisiva — esta que antes brilhava tão intensamente que lhe cegava, agora passa sempre suave por suas retinas e lhe massageia a face. E mais: nunca o deixava só.

Hoje ele ainda lembra, com saudades, dos bons tempos da licença médica e, quando é possível, ainda acompanha o Vale a pena ver de novo. Diz ele que não ficara hipnotizado, nem nada, que tudo era bobagem, mas a verdade é que os bordões permanecem, os comerciais sabe de cor e seus horários são todos baseados na Rede Globo."

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BBB

Não sei a que devo o tópico, mas acredito eu que seja porque estou mais focada no mundo televisivo devido a faculdade e à licença médica. De qualquer forma, peguei-me a pensar sobre o quão triste deve ser viver no Big Brother — não ignoro que eles têm comida, ar condicionado e ainda quinze minutos de fama, mas ainda assim deve ter um Q de tristeza em ser tão (temporariamente) Global.

Durante não-sei-quantos-meses lá se fica trancado, naquele que se torna seu lar. Lar este cheio de pessoas desconhecidas, vindas de diversos lugares com o único objetivo de te tirar de cena em busca do prêmio maior e ainda sendo vigiado vinte e quatro horas por dia dependendo de mais gente que não te conhece para continuar sobrevivendo. É praticamente como dormir, comer, viver ao lado de cobras.

Claro que na vida real também é assim, com a diferença que se tem para onde correr e lá não. Aqui fora podemos pegar um ônibus e desaparecer um pouco, entrar em um bate-papo e conhecer alguém de outro lugar completamente diferente. Lá dentro nem uma dessas escapatórias sociais é possível ter. Argh.

E aí tudo se completa com a votação. É quase como dar um tiro em alguém: imagino que alguns tenham prazer em apontar, mirar e atirar. BUM. Quem mais tiros leva, vai para a berlinda junto com a outra persona non grata (ou 'os fortes', 'o votado por não ter opção' ou qualquer outro termo que gostam de usar). Quando alguém finalmente é eliminado (executado), vem o vazio deixado pela morte.

Assim como este post, deve ser muito deprimente.

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