Duas e Dezessete

Duas e Dezessete

Ontem, já à noite, ele anunciou ter encontrado um inimigo, desses que pareciam ter tomado anabolizante e que travava lutas por aí. "Não pensa, mata", mandei, como uma verdadeira tirana, sem dó, nem piedade. Ô serzinho nojento, desprovido de qualquer partícula socialmente aceitável. Morte, morte, morte.

Eis que o eliminador falhou em sua tarefa: pelo despreparo que o levou a distração e, consequentemente, a fuga do elemento — pois de certo era um macho.

"Se escondeu" justificou-se o matador e, conformado, voltou ao seu posto em descanso. Frustrante, mas nada surpreendente. Ele, em um ato insano, logo após a desistência, quis apagar as luzes.

"Perdeu a cabeça? Além de nos deixar desprotegidos, ainda nos banhará pela escuridão e dará a ele o crédito de se esconder e atacar sem que possamos nem mesmo ver?!"

Com o alerta, afastou a mão do interruptor e deitou-se, totalmente vencido, sob o colchão. Davi vitorioso sob Golias — mais uma vez. Tranquei-me, muito depois, em meu próprio refúgio e não sai de lá até que a luz do sol adentrasse pelas janelas e me permitisse o luxo da clareza por todo o ambiente. Passei o restante do dia a ponderar, imaginar, desejar que ele já estivesse fora. “Será que ele já se retirou? aproveitou a noite, redimiu-se e foi para outro lugar?"

Como pode um sujeitinho desses pensar que, simplesmente, pode chegar e se acomodar, se fazer em casa? Imaginei-me, sentindo arrepios, claro, não podendo ir ao banheiro pela sua presença; não me estirar no sofá por receio que ele surja e me afaste do sossego. Como posso dormir com a ameaça dele entrar no meu quarto e... Deus!

E aí, nesta turbulência, o localizo: bem em cima da MINHA mesa, onde me sento, onde como, onde falo, onde a tudo faço e ele bem ali, se achando dono da madeira, crente, crente que pode correr para lá e para cá. De repente me vi como Arturo, só que em vez de caranguejos, era com baratas que eu estava lidando; e à guisa de um massacre, algo limpo e discreto me bastava: um único golpe e ela (ele, pois de certo era um macho) estava morta ao chão.

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9 Response to "Duas e Dezessete"

  1. Anônimo Says:
    fevereiro 10, 2009

    Rebecca,

    seu texto já esta programado para ser postado no QUEM CONTA UM CONTO...
    Mande outros, se gostar da repercussão.

    Abçs

    Eduardo

    PS- Estou linkando seu blog no Varal.

  2. Anônimo Says:
    fevereiro 11, 2009

    hahahahahahahaha
    me lembrei do texto que escrevi do papai noel dentro de um vidro.
    enfim, bom texto.
    devo deixar claro minha preferência pelo da escritora!
    = ]

    beijos!

  3. Anônimo Says:
    fevereiro 11, 2009

    =D
    coitadaaa da barata Becca Joneees :O
    estou chocada com tua falta de humanidade auishaiuhsiuahsiauhsi

  4. Flavina . Maria says:
    fevereiro 12, 2009

    AAIiiiiiiii, iosso é do tipo que me causa pânico....
    Adorei, apesar do "sujeito" central do texto me causar horror,rsrsrsrs
    Um grnede abraço....

  5. Eduardo says:
    fevereiro 15, 2009

    baratas vão dominar o mundo!
    antes baratas do que pernilongos, mosquitos e moscas!

    e os textos sempre ótimos, o que já neem é novidaade. ;D

    beeijo

  6. Tempero Musical says:
    fevereiro 16, 2009
    Este comentário foi removido pelo autor.
  7. Tempero Musical says:
    fevereiro 16, 2009

    Olha, eu comecei a ler o conto pensando tratar-se de um homem, um desejo sexual irreprimido por um macho sem cérebro.
    Depois, descobrir que era uma barata me trouxe uma surpresa !
    Ah, estes homens... Joios, trigos... Preciso deles. Dentre escolher (ou ser escolhida, é tudo uma reciprocidade) há de se ter a clareza de os escolher sem ficar de barriga vazia... O trigo, o pão, o sal da terra.
    Matá-los sobre a mesa ? Deves ter visto um filme que se chama 'A mulher, o cozinheiro e o amante', onde, em certa etapa do filme, o marido mata o amante e a mulher cozinha (literalmente, um corpo a ser comido sobre a mesa) o amante para seu marido comer usando um revólver à sua cabeça como álibi. Não sei bem se esta é a ordem exata dos substantivos do nome do filme, mas é uma imagem visceral ver o marido a fincar o garfo no corpo do amante assado bem perto da virilha, tremendo.
    Mulheres... Sem os homens não sou nada.
    Beijos, vou estando por aqui.
    Claudia Kämpf.

  8. A menininha says:
    fevereiro 22, 2009

    ADOREI o conto!!!!!


    Bjuss

  9. A Torre Mágica | Pedro Antônio de Oliveira says:
    fevereiro 23, 2009

    Bom demais o seu blog! Parabéns! Voltarei e voltarei, sempre!

    Abração.

    Pedro Antônio - A TORRE MÁGICA -
    www.atorremagica.blogspot.com