1.

Em Abril teve a tal greve de ônibus aqui no Rio. Só que eu, desavisada no início da manhã, parti pro ponto faltando meia hora para o início da minha prova. Cheguei lá e o lugar estava lotado de gente ― todos desavisados. No meio daquela coisa toda, acabei descobrindo uma menina que estudava no meu campus e ela me disse, apavorada, que já estava ali há mais de uma hora. Achei doidera alguém ficar esperando por um ônibus aquele tempo todo, mas enfim… Deus sabe o que faz.

E ai estava quase indo embora quando um fura-greve chegou, dirigindo com certa dificuldade aquele veículo abarrotado, cuspindo gente pela janela. A garota, que estava com um terço na mão, me convenceu a tentar pedir para a professora aplicar a prova pra mim. Deixamos o povão entrar e conseguimos ficar num nível remotamente parecido com o conforto antes da roleta.

Não deu dez minutos e eu já estava lembrando desse pouco conforto como uma época de ouro. De repente tinham umas quinze pessoas naquele espacinho e uma única janela soprando pouco vento. Lá pelas tantas, três senhoras nanicas entraram e se enfiaram entre a gente, como um carro compacto numa vaga apertada. Uma delas gritou, juro, como um brado de guerra: “EU VOU CHEGAR AO INCA!”

Como não poderia ser diferente, esta resolveu ficar ao meu lado e tossia de tempos em tempos. Aquilo estava me dando nervoso. Aquele bando de gente, o calor, a falta de vento, a mulher tossindo… Fiquei seriamente enjoada e ao invés do cara dirigir sem medo de ser feliz, não! Resolveu parar no ponto seguinte, mas a passageira não conseguiu entrar. Agarrada às barras do ônibus, ela impedia que o motorista arrancasse. Ficou naquele desce, não desce que não terminava até que uma menina berrou lá do fundo: “PUXA ELA PELAS PERNAS!”

E no meio disso tudo, vira a tal garota de terço na mão e me pergunta: “Qual é o seu Orkut?”



INCA: Instituto Nacional de Câncer
também postado em: http://naoeatoanao.blogspot.com

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Nota de uma Garota Sei lá

Durante muito tempo quis aqui sentar e aqui escrever coisas ótimas, incríveis – devo dizer inesquecíveis. Dessas que não passam despercebidas e são iluminadas de amarelo pelas canetas de papelaria. Quis crer que o poeta era de fato um fingidor – e ainda creio, creia-me. Contudo aprendi em tão pouco tempo que não é bem assim. As coisas chegam, as coisas fluem, a gente as vive, elas acontecem. Ou elas acontecem e a gente as vive. Não sei, só só que são assim. Simples assim.

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Editar. Renomear.

Escreve. Edita. Apaga. Troca palavra. Não ficou bom. Apaga.
Apaga. Apaga.
Exclui a linha inteira.
Esquece.
Fecha no xis. Se desejo salvar? Hesitação. Cancelar.

Às vezes me sinto tão anestesiada quanto às coisas que acontecem ao meu redor…

É isso!
(Enfim algo pequeno. Minha professora da sexta série ficaria orgulhosa.)

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Eu blogo, eu desabafo.

É impressionante como as coisas fluem entre as pessoas que nos cercam — ora tão leves e serenas, ora tão complexas e cheia de farpos.

Dia desses andava na rua quando me deparei com uma figura que fez parte da minha vida lá no meio da avenida do ano de dois mil e seis ou sete (ou ambos). Confesso que não foi uma das pessoas mais divertidas ou agradáveis que conheci, mas foi alguém importante para mim — ainda que eu viva me esquivando dos seus convites para aniversários, festas e por aí vai. Como disse, algumas coisas podem ser bem complexas.

O caso é que encontrei com ele. Nos cumprimentamos: aperto de mão e dois beijos no rosto, alternando as faces. O de sempre — minto, o que costumava ser o de sempre. Logo em seguida, ele me perguntou "E aí, tá pegando quem?", o qual respondi com "Nossa, o que aconteceu com o tudo bem??". Ele riu e me acusou de fugir da pergunta.

Não quero parecer indelicada, muito menos uma fugitiva de perguntas, a questão é que não vejo sentido nessa atitude. Por que devo falar de algo assim, e tão precocemente, com alguém que não vejo há, três ou quatro anos?

Tenho uma outra amiga com quem mal falo, pois sempre consigo prever nossas conversas. É algo mais ou menos neste caminho: eu digo oi, ela responde com outro oi, perguntamos se está tudo bem uma para a outra e ambas dizem que está tudo ótimo e, então, ela vem com E aí, pegando muito?. Mando um emoticon de sorriso discreto e ela se põe a contar as histórias dela, sem convites. Não duvido que sejam verdade, embora tenham sempre me parecido um tanto fantasiosas — flores demais, you know what I mean?

Na verdade, há uma competição entre as pessoas onde não há opção de 'não quero brincar'. É como se fosse algo bastante subentendido. Se eu digo que ganhei dois presentes de Natal, outro diz que ganhou quatro e este se torna o vencedor até que venha outro dizendo que ganhou mais que nós dois juntos.

É ridículo e é patético; e acontece com frequencia com quem vos fala.

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Sobre a vida e crustáceos

Sobre a vida e crustáceos

Morrer é o maior risco de viver. E tem vezes que pedimos pelo fim. Vi isso ontem. Sai do trabalho cedo e fui para o ponto de ônibus. Lá encontrei umas crianças que judiavam de uns caranguejos que eles arrumaram sabe Deus como, sabe-se lá pra quê e só posso supor onde.

Dentro de uma sacola plástica com água e areia, o bicho era sacolejado e se encontrava espremido — até que resolveram soltar o pobre, que logo abriu os “braços” e ameaçava dar um beliscão no primeiro palhaço que encontrasse. Não sei, mas ele me pareceu bastante mal humorado — e não lhe tirei a razão.

Curioso é que semana antes eu mesma estava fazendo teatro com um caranguejo-defunto(ou defunto-caranguejo), mas este era de um bom humor invejável e filosofava sobre o fato de que seria em breve consumido.

A morte do caranguejo é uma das mortes mais cruéis que há — se não a mais vil. Há quem bata na cabeça do sujeito (uma preparação para o ato em si, não sei), enfie facas em suas aberturas, o jogue dentro de uma panela cheia de água fervendo! É de morrer!

O que as crianças fizeram ontem foi hediondo. Quando o bichinho (jeito carinhoso de chamar, pois se tratava de um monstro) se livrou do saco, recebeu tantas chineladas que chegou a ficar tonto. Como se não bastasse, a todo ônibus que estacionava, um ou outro moleque colocava o caranguejo no degrau. Até que chegou o momento em que colocaram o sujeito dentro do ônibus e o motorista, desavisado, fechou as portas. Lá foram as crianças correndo avisar pro cara que tinha “um bicho enorme e perigoso lá trás”.

Depois de tantas aventuras, finalmente viram que ele estava ou muito mal ou já morto. E aí deu uma louca (sim, ainda mais intensa) entre o bando, abriram um pote de maionese e esparramaram o conteúdo no chão: de lá saíram vários mini crustáceos, correndo para todos os lados, como se tivessem assistido à cena de terror feita com o companheiro gigante. E se aquele gigantão não foi páreo aos moleques (e a moleca), que chance teriam eles? Desataram a correr e aí foi um escândalo — entre as crianças, entre as pessoas que esperavam pelo ônibus e, como já dito, entre os mini crustáceos.

Houve muitas chineladas, chutes que levaram corpos para o meio da avenida para serem massacrados. Dentre estes, estava o Gigantão que aguardava em paz à rodada de misericórdia. Uma pata, de dono desconhecido, já separada do corpo, se mexia lentamente perto do meio fio. Um show de horrores que terminou com vários corpos esmagados no asfalto. Houve um enjôo, uma revolta e uma vergonha no final.

Há um trecho em “Misto Quente”, livro escrito pelo Bukowski, em que uns moleques aparentemente arrumaram uma briga entre um buldogue e um gato. Tenham arrumado ou não, também não faziam esforço para evitar a situação. Nesta parte, a personagem conclui que o gato não lutava apenas contra o cachorrão, mas contra toda a humanidade.

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o poeta é um fingidor

enquanto pecorro esse caminho
estranho e tão só, distinto
me bate saudades de tempos tão recentes
daquela torrente mista de alegria e
loucura
em que era eu tão crente.

absorta em fantasioso mistério
respirando promessas, anseando momentos
tudo ficou para trás, por onde os carros
andam
e por onde acabo de passar, passeando.

ainda que o cheiro e som estejam íntimos
e que o toque ainda me encoste
que o indisfarçável tremor na sua voz
me fascine
ainda é passado — efusivo, delirante.

de ti não peço o amor
quando há o perdão e adeus
peço que não fiques triste com minha
ausência
que mais triste que amor não
correspondido
é amor escondido — eclipsado,
jamais alcançado.

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something in the way

Não muito antigamente, abria a janela do meu quarto e aquela brisa congelante me encontrava instantaneamente. Um som de algo pesado correndo se aproximava muito rapidamente até que surgia ofegante a minha frente. Costumava encostar meu nariz em seu focinho, afagar e puxar suas orelhas e lhe coçar o topo da cabeça. Sempre muito quente, tinha impulsos fortíssimos de passar meus braços por seu pescoço e encostar minha orelha aos seus pêlos.

And I can’t complain.

Um pouco antes desse tempo, em determinada ocasião, daquelas em que nos encontramos no meio de um turbilhão de acontecimentos e o amanhã é algo totalmente inesperado, saí já no meio da noite, a rua um deserto, com um pequeno ser de cor amarelada, que nada entendia. Lembro de ter corrido tanto, tanto, tanto. Um tanto que hoje não correria. Senti o mesmo vento gelado tentando me parar enquanto nós corríamos a toda, sem um destino definido. Depois fomos parando, de bocas abertas e o calor nos invadindo o corpo. Acho que sou uma pessoa de vento e faz tempo que não me sinto leve assim.

And then, unexpectedly, I think of you.

Hoje o casaco traz esse quente para a vida e nem um pestanejo se dá antes de vesti-lo. Durante toda semana o usei até para tentar dormir. Em meio de tantos momentos fitando o escuro do quarto e virando de um lado a outro, implorando por minutos de sono e paz nos meus sonhos, me encolhia buscando algum conforto em vão. Em puro vão. Minha cabeça era alfinetada a cada movimento e minhas costas estavam duras, tensas, ao toque dos meus dedos. Fechava os olhos e muito tempo parecia ter se passado, olhava o relógio e descobria que o ponteiro teimava em sair do lugar. Rezava pela hora de acordar logo e de voltar a dormir assim que fosse possível.

And then, I think of you — so far and yet so close to me.

Das conversas ao meu arredor que me acuavam, do medo do contato com outras pessoas, principalmente em lugares fechados, do não ter-me feito entender, das promessas que no íntimo sei que não se concretizarão, dos dias e das noites tensas, do refúgio inexistente, dessa falta de comunicação, dessa doença é que a repetição, desse tédio sempre tão presente, desse se preocupar com coisas pequenas e essas dores, desse comercial de si, essa piada tão manjada, do não acreditar, do não saber ser...

Honey, it’s for you.

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